Eduardo Giannetti, o economista que ajudou a montar o programa de Marina Silva para disputar a presidência, ainda está em campanha. Em suas palestras, cada vez mais numerosas, diz que a melhor maneira de salvar o ambiente é taxar os produtos que poluem
Por Karla Spotorno
O economista mineiro Eduardo Giannetti da Fonseca atingiu o ápice de sua popularidade há quatro anos, quando estrelou um quadro do programa Fantástico, da TV Globo, sobre juros. Falava do tema em termos das escolhas que fazemos cotidianamente: acordo agora ou desligo o despertador e falto à academia? Pego um empréstimo hoje ou espero para trocar de carro? Assim conseguia trazer para o cidadão comum a essência do conceito de juros, tema de seu livro O Valor do Amanhã.
Para quem ainda guarda esta imagem, assistir a uma palestra dele agora reserva uma surpresa. Giannetti anda falando muito menos do amanhã. Ele agora fala do hoje. Anda preocupado – angustiado, até – com a falta de sustentabilidade do modelo econômico mundial. Não à toa, ajudou a coordenar a campanha de Marina Silva, candidata à presidência da República pelo Partido Verde. Giannetti prega uma revolução no modo de determinar os preços dos produtos e serviços. Quer incluir o ônus ambiental na conta ao consumidor. De certa forma, é calcular o valor da destruição, para as gerações futuras, e trazê-lo para valor presente.
A contabilidade hoje não computa os recursos aos quais nunca se fixou preço: o ar, a água e a luz do sol, por exemplo. Se um país perde grandes fábricas, o PIB cai. Mas se perde um rio ou uma floresta, a conta não se altera. No modelo defendido por Giannetti – sugerido no final do século passado por economistas alternativos –, os produtos e serviços que oneram o meio ambiente ficariam mais caros. Inclua nos custos de produção a emissão de dióxido de carbono (CO2). Pronto. A energia gerada por uma termoelétrica a carvão mineral pode ficar mais cara que a energia solar. “Um novo sistema de preços é o ideal, porque envolve a todos e muda o comportamento tanto do setor produtivo como do consumidor”, afirma. O argumento contrário é que isso traria inflação. Economistas liberais defendem que as novas tecnologias vinguem apenas quando as pessoas optarem livremente por elas. Giannetti diz que a construção de um modelo econômico que preserve o ambiente não pode esperar pela conscientização voluntária de empresários e consumidores. Em vez de mirar o coração, é preciso atingir o bolso.
A preocupação ambiental parece autêntica. Aos 54 anos, Giannetti não tem carro. Poderia comprar um modelo popular a cada palestra remunerada que dá. Mas prefere andar a pé. Sempre que pode vai aos compromissos pelas próprias pernas, mesmo quando isso lhe custa 40 minutos. “No caminho, vou pensando no que vou falar. Acho que até melhora meu desempenho na palestra.” Ele se muda agora em julho para a Vila Madalena, na Região Oeste de São Paulo, onde se pode fazer tudo a pé. Anda pensando em mudar a dieta e virar vegetariano. A decisão estaria alinhada a seu discurso contra a devastação causada pelo gado no mundo.
Sustentabilidade não é o único assunto de Giannetti – seu leque de opções para os contratantes inclui macroeconomia, a dicotomia entre mente e cérebro, ética e outros seis temas. Mas ela contamina qualquer de seus discursos. É um recado cuja potência vem aumentando. Não só porque Giannetti tem feito mais palestras (o número tem crescido quase 30% a cada ano, até as 71 de 2010), mas principalmente porque ele causa impacto duradouro em pessoas influentes. “É o tipo de palestrante que deve ser ouvido no máximo duas vezes por ano”, diz Horácio Lafer Piva, sócio e conselheiro da produtora de papéis Klabin, amigo de Giannetti desde o ensino fundamental. “Depois de uma palestra, você sai com questões para refletir e resolver internamente por uns seis meses.” Fabio Barbosa, presidente do conselho de administração do Santander no Brasil, diz o mesmo sobre os livros de Giannetti. Segundo ele, O Valor do Amanhã o fez mudar a maneira como tomava algumas decisões e até a forma como enxergava o crédito. “Esse livro me marcou profundamente.”
Giannetti jura que, se Marina tivesse sido eleita, ele não aceitaria nenhum cargo executivo. “Não gosto de dar ordens e me incomoda participar de reuniões”, afirma. “Não gosto do conflito, da controvérsia. Nesse sentido, sou muito individualista. Minha ambição é ver minhas ideias fecundas.” As palestras são uma ótima maneira de conseguir isso. “Ele chamou nossa atenção para a necessidade de a empresa não apenas ser, mas também parecer sustentável”, afirma Luciana Pellegrino, diretora-executiva da Associação Brasileira de Embalagens, que o ouviu num seminário internacional de embalagens em São Paulo, em março. “Ele diz que a percepção da sociedade tem um peso grande em relação às suas escolhas.”
O MONGE E O ECONOMISTA
Giannetti estreou como palestrante há mais de 20 anos. Hoje faz entre uma e duas palestras por semana. Boa parte é gratuita. A parte que é paga é muito bem paga. Elas vão de um discurso num congresso de neurocientistas e psiquiatras em Gramado, no Rio Grande do Sul (de graça) a uma apresentação em Lima, no Peru, para falar a executivos da General Electric de 13 países (paga), ou a conferências na França e em Portugal. No começo da carreira, era tímido. Por isso, anotava tudo o que pretendia falar, inclusive as piadas. Hoje, parece se divertir. Ri das próprias anedotas, repetidas à exaustão ao longo da carreira. E é afável ao responder a perguntas da plateia. Mas ainda entra em cena com um bloco, com anotações escritas à mão.
Em sala de aula, o professor Giannetti diz que valoriza mais uma conclusão errada do aluno que a reprodução correta de algo que está no livro. Ele é professor do Insper, um instituto de ensino e pesquisa de negócios e economia. O ofício lhe toma pouco tempo. No primeiro semestre, foram só 12 horas em sala. É docente de programas complementares ao currículo da graduação. Mesmo essa rotina pacata torna-se pesada quando ele mergulha na produção de um novo livro. Seu sonho, diz, é “ter uma ideia original”. Para escrever, se isola. Mesmo com o filho, Joel, um mestrando em filosofia de 25 anos, só fala por telefone. Por até quatro meses, muda-se para uma pousada em Tiradentes, Minas Gerais. “O Eduardo vira um monge. É inacreditável a capacidade de concentração dele”, afirma Isa Ferraz, documentarista que dirigiu a série O Valor do Amanhã, no Fantástico, em 2007.
http://epocanegocios.globo.com/Revista/Common/0,,EMI245847-16642,00-O+VALOR+DO+HOJE.html
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